29 de março de 2007

Coração de Gás Neon


A trajetória de um personagem em meio a devaneios, fracassos e angústias que sofre após perder seu amor, e quando decide encontrá-lo numa busca desesperada. Ora indo por dentro da chuva, ora esperando numa mesa de bar, esse personagem anônimo expõe sua intimidade, retratando a solidão e apresentando uma visão dramática do mundo urbano moderno.


A escolha foi em função do Caio. Texto algum dele não poderia faltar no Festival nem nós poderíamos perder.

E em todos os momentos do espetáculo é possível enxergar Caio Fernando Abreu expondo seus pensamentos e angústias, o que foi, certamente, o grande mérito da peça. Um cenário onde todas as coisas ajudam a lembrá-lo, desde o colchão no chão, os cigarros, o caderno de anotações, o som ao lado da cama, o montinho de lenços de papel amassados no chão - detalhe este com o qual também eu e minha rinite alérgica nos identificamos instantaneamente - até o ator Andy Grecker, de semelhança física inegável.

A música foi parte integrante do espetáculo e presenteou a platéia com uma trilha sonora de combinação particular. Melhor ainda foi o próprio personagem selecionando as músicas conforme o que ele queria ouvir e qual música era melhor para o momento. Somada ao texto, diria que foi o toque de mestre para emocionar as pessoas. Eu mesma sentia as lágrimas brotarem com uma facilidade incrível, sendo que, embora bonita, a encenação, ela mesma somente, não comoveria assim.


Nosso personagem está na fossa. Foi abandonado e agora curte altas doses de tristeza e espera. Enquanto isso, relembra.

Relembra o momento da despedida, quando ele tentava dizer todas as coisas, "essas coisas difíceis, que não encontram palavras para serem ditas". E na sua recordação e na busca pelas palavras, é atropelado pelo outro que parece viver na superfície, preocupado com os cigarros, em comprar maçãs ou em encontrar uma revista para ler na viagem, diferentemente dele, que sempre vai até o fundo.

Nessa ânsia meio caótica, encontra metáforas que usaria para se explicar ao outro e as anota no caderno, perde o fio da meada, recomeça o discurso e se atrapalha, como quando pronuncia uma frase que leva à letra de uma música: eu preciso te falar e, imediatamente, corre até o microfone instalado ao lado da cama e continua, desta vez, cantando: te encontraar de qualquer jeito...eu preciso respiraaar o mesmo ar que te rodeeeia...

Consome-se na dúvida: “Você seria aquilo que eu via, ou aquilo que eu queria ver em você? Eu sempre achei que 'amar' fosse 'conseguir ver', e que 'desamar' fosse 'não mais conseguir ver'.

Até concluir, ainda em dúvida:

“Talvez as coisas que me fascinavam em você nem fossem suas, mas minhas.”

Abrindo parênteses, um processo de auto-sedução bem típico mesmo. Os que se entregam para alguém dotado de alguma habilidade (e nenhum amor) sempre correm o risco de se apaixonarem pelo seu reflexo no outro. Como diria o Marco, isso é tudo tão humano. Fecha parênteses.

Relembra uma noite fria e chuvosa em que percorria a cidade molhado, carregando uma garrafa de conhaque, atormentado pelo desejo de bater à porta do outro e, em devaneios, se imagina recebido com um abraço, convidado a se sentar à lareira, onde beberiam o conhaque juntos ouvindo música cantada por alguma voz rouca. Tudo muito diferente do que ocorre na realidade, no entanto.

Relembra sua espera sozinho num bar, incomodado com o casal sentado ao lado, imaginando que o casal sentia pena de vê-lo naquela situação e nos derrama toda a sua angústia e solidão.

Por fim, um texto belíssimo e muito sincero que não foi encenado com a carga dramática que merecia. A impressão mais pura nos levou a concluir por uma certa pretensão em utilizar um texto tão rico e profundo numa atuação tão pouco convincente.

As fotos, com os devidos créditos, são daqui e daqui.

Coisas incríveis mantidas em segredo até então.


Pensamentos, desejos, manias, medos, sentimentos, realidade e fantasia. O universo de duas mulheres que pensam e agem de maneira distinta, mas que também possuem diversas semelhanças e mostram um pouco do que confessamos apenas para o espelho, ou nem mesmo para ele.

Duas amigas se encontram em uma mesa de bar – uma, enquanto esperava o atual namorado chegar, e outra, encomendando as suas trufas e o expresso, como fazia todos os dias – depois de, ao que tudo indica, anos sem notícia uma da outra. Foram muito unidas algum dia, e a separação deu-se por conta de uma briga que, mais tarde, iriam notar que nem se lembravam o motivo.

A peça foi escrita pelas próprias atrizes, Larissa Crocetti e Márcia Maggi, sendo adaptada pela diretora Fábia Guimarães, e trata basicamente disso, das lembranças guardadas e das perdidas, do resgate da cumplicidade, de observações e percepções particulares das personagens sobre a mesma situação. Tudo isso numa noite qualquer, regada a vinho e a divagações mis.

As duas personagens são diametralmente opostas: uma que não se fixa em relacionamento algum, sempre terminando antes que terminem com ela, todo o medo de ficar sozinha e de não ser lembrada; a outra, que é separada e voltou a morar com a tia, não sabendo porque tudo havia terminado, quando na verdade a culpa foi essencialmente dela, sem que ela supostamente reparasse. Sendo que uma é vista pela outra com admiração e, quem sabe, inveja, justamente pela complementação toda entre as duas.

Sei que tudo isso com tiradas muito engraçadas, variando entre um humor às vezes sutil e às vezes escancarado. Por exemplo, o shampoo para cabelos normais. "Você usa shampoo para cabelos normais?? Quem você pensa que é?? Entre todos os shampoos do mundo, para cabelos danificados, secos, ressacados, oleosos, sujeitos à ação do tempo, com pontas duplas, muito crespos e afins, você tem a petulância de achar que pode usar shampoo para cabelos normaaais??".

E o fato de se guardar sempre lembranças inúteis na memória, achando que um dia pode precisar delas, ocupando o espaço das coisas realmente úteis. E de não querer mais processar informação alguma, já que isso implicaria em se desfazer de alguma daquelas sem utilidade que você guarda há tanto tempo por comodismo.

Tudo isso entre tantas outras.

Ah sim, e são distribuídos na entrada do teatro pacotes de pipoca, daqueles cor-de-rosa, de pipoca doce. Nem vou dizer do quão milagroso e providencial foi o tal pacotinho, uma vez que a peça foi às 20:00 de uma sexta-feira, e nem eu e nem Merilú tivemos tempo de comer nada desde o serviço, mais precisamente, desde o almoço. Então imagina a festa. E peguei justamente o último pacote do saco mor, o que, segundo a mocinha da produção, significa sorte e que 'ele vai ser meu'. Agüente, agüente.

No final da peça é que os pacotes todos vão fazer sentido, e a metáfora foi das melhores:

A vida é como esse pacote de pipoca, a gente come e são todas amargas, nem sei porque continuamos comendo. Mas aí a gente acha uma doce, e é tão bom que a gente não quer mais parar de comer só para achar outras tão docinhas. E tudo com muito cuidado para não deixar que, num descuido, caiam pipocas e mais pipocas no chão, porque se pode, nesta única desatenção, perder a única pipoca doce do pacote inteiro.

27 de março de 2007

“Bom dia pra quem é de bom dia, boa noite pra quem é de boa noite...”


Paralelamente ao Festival, Curitiba foi agraciada com o show do grupo carioca MONOBLOCO, na sexta, dia 23/03, no Espaço Cultural Calamengau.

Eu mesma nunca tinha ouvido Monobloco, mas muito me apeteceu ver Pedro Luís no meio dos outros tantos (e muitos) integrantes, cada um deles devidamente munido de seu instrumento de percussão e, mais ainda, quando li sobre o repertório musical que inclui desde sambas-enredo até Tim Maia, passando por Alceu Valença (adouro) e Jorge Benjor.

E agradeço a todos os santos por não ter ouvido nada antes e ter tido o privilégio de sentir todo o impacto de ouvi-los e vê-los em ação, de uma só vez e ao vivo.

E o impacto, amiguinhos, é grande.

A ponto de fazer uma trabalhadora de sol a sol, depois de uma semana do cão, encarar muitas horas de aglomeração e calor insuportável, pelo muito batuque e animação contagiantes. E não tivesse eu superado o cansaço, o calor e a aglomeração para assisti-los, levaria cá comigo uma frustração enorme pela vida afora.

Porque é tudo realmente imperdível.

Aí, já inteirada do assunto, soube que o grupo surgiu a partir das oficinas de percussão de Pedro Luís e a Parede e formou um bloco de carnaval com 16 a 21 ritmistas que inovaram o carnaval de rua do Rio. Aqui em Curitiba o efeito não foi nem seria menor, ao contrário, já que carecemos desde sempre de um carnaval de rua realmente animador (lembremo-nos de que o evento máximo produzido no carnaval de Curitiba deste ano, por ex., foi a caminhada de zumbis - vide post abaixo).

O show seguiu um ritmo de baile de carnaval fora de época, muito adequado ao calor também fora de época daqui, já que em anos passados bem me recordo de que em fins de março usávamos casacos de lã e cachecóis. Mas nem tudo se pode chamar de carnaval e mesmo aqueles que não gostam da festa são certamente agradados pelas misturas e arranjos feitos pelo grupo para as músicas da Nação Zumbi, Rappa, Dorival Caymmi e muitos outros que não são do gênero samba propriamente, ou somente da bateria do bloco que é, por si só, um acontecimento.

Pra usar de um dos refrões deles: M-O-N-O-B-L-O-C-O, que beleza, uh, monobloco!

26 de março de 2007

"Não é maravilhoso como nunca nos recuperamos?"



Thom Pain – Baseado em Nada, foi um dos finalistas do Prêmio Pulitzer de 2005. Trata-se de uma peça em que um homem comum reflete sobre a infância, desejos, decepções e perda, catalogando as eternas agonias da condição humana. Lady Grey – Em Luz Cada Vez Mais Baixa, o outro monólogo deste espetáculo, é, também, o outro lado do primeiro texto. Nele uma atriz tenta preencher o vazio para, eventualmente, conseguir viver. Como em um exercício de “mostre-e-conte”, ela tentará mostrar ao público algo que a faça reencontrar-se depois do abandono.

Esta era desde o início um desafio. Por ser um drama, no meio de tantas comédias e de tantos outros gêneros que misturam música, dança e circo, por isso, todas promessas de risos e leveza. Por serem dois monólogos, primeiro do Thom Pain e depois da Lady Grey, divididos por um intervalo anunciado anteriormente, e ter duas horas previstas de duração.

Na verdade, na verdade, deve ter passado de duas horas, mãs, não podemos afirmar com certeza já que eu e Kerol, com toda a dor no coração e uma culpa dilacerante que tentamos expiar no caminho até o Café do Teatro, saímos exatamente no intervalo da peça. Também para evitar a angústia crescente de presenciar as pessoas levantando e saindo no meio da peça. Porque essa parte foi realmente péssima.

Não é da minha natureza iniciar as coisas sem terminá-las ou desistir no meio do caminho, por mais razões que haja, daí que ainda que não esteja muito agradada da cousa eu sempre acompanho até o fim. Mas tendo ouvido boatos de que a melhor parte era a do Thom Pain e tendo sido esta já bastante cansativa, não houve maneira.

Mas o texto é muito bom, de Will Eno, dramaturgo americano tido como descendente de Samuel Beckett e Edward Albee, e Guilherme Weber está excelente no papel de Thom Pain, tendo um domínio de palco invejável, infelizmente desfavorecido pela impaciência de todos com o tempo de duração do monólogo. Quanto à Lady e à atriz que a interpretou não posso opinar, já que como disse, não ficamos pra conferir.

Thom Pain inicia a peça no escuro acendendo um isqueiro na frente do próprio rosto e perguntando à platéia: “Vocês precisam me ver pra me ouvir?” Pergunta-nos qual o significado de “medo”, para o que apresenta várias respostas num jogo do tipo “assinale a correta”, conta estórias de um menino, sugere que se fale de amor, conta a história de uma mulher, fala da vida moderna e de violência, ironiza o tempo todo dizendo que somos todos muito pacientes, por ficarmos o ouvindo falar, “eu no lugar de vocês estaria com sono, fome, calor, aproveitaria esse tempo para fazer outras coisas” - momento very dangerous este -, e faz o seguinte comentário ao acompanhar com o olhar o primeiro de tantos que se levantou no começo da peça e saiu:

“Eu sou como ele. As pessoas me percebem como alguém que acabou de sair.”

Se a idéia da peça era a de que o público, de uma forma ou de outra, se sentisse refletido nas palavras e no sentimento do personagem, servindo-se do Thom para dizer ou reconhecer o que sente, pode-se dizer que o intuito se realizou, ou, de que se realiza com certo sucesso, porque, querendo ou não, somos todos jogados na posição de interlocutores passivos, como li numa crítica por aí, e desta posição não escapamos, ainda que um tanto desconfiados com a identificação, embora privilegiados por podermos esconder isso.

A mágica do teatro.

Como afirmaria Thom, com boa dose de cinismo: “Vocês não precisam de mim pra dizer o que vocês sentem, afinal.”

Começamos bem

Sim, apesar do silêncio todo até o momento, estamos aqui animadíssimas com o Festival de Teatro e assistindo, até agora, ao menos uma pecinha por dia. Ou noite, no caso.

O problema é arranjar tempo para contar. Sabe que, principalmente depois de final de semana nesta função tão empolgante que é a saga teatral do ano, a última coisa que se tem vontade de fazer é de trabalhar. Sério mesmo, a vontade é ter todo o tempo livre para assistir a tudo, nos mais diversos horários, mesmo nos dias de semana. Mãs, minha escassa fortuna ainda não me permite. Percebam o otimismo do 'ainda'.

Então, a primeira delas esse ano foi Mais Amores & Canções, no Teatro da Caixa.


A peça mescla cenas de temática afetiva com performances cover de ícones musicais que marcaram as últimas décadas. As histórias narram aventuras e desventuras românticas e mostram como os relacionamentos se desenvolveram a partir da década de 1960 até a atualidade.

O gênero é Comédia Musical. E realmente, mais musical e mais comédia que isso, impossível.

A peça é continuação da "Amores & Canções", montado em 2003 e que recebeu cinco indicações pro Troféu Gralha Azul, ganhando o de diretor revelação.

Não assisti à primeira, mas posso assegurar que a segunda vale à pena. É diversão pura e descompromissada, com excelentes recursos de áudio e mudanças de figurino que desafiam as leis da física. Ficamos deveras intrigadas com a rapidez da coisa toda, levantando a hipótese mui plausível de que o elenco todo era formado por gêmeos, que se revezavam enganando o público. Só pode.

Mãs. A peça é uma montagem que tem como base a evolução musical ao longo das décadas, e a partir daí, são contadas mini-histórias mostrando a evolução cultural de nossa querida sociedade, entre uma performance e outra. Todas em ordem cronológica, indo de Beatles a Cher, passando por Disco, Hair, Thriller e Mague beat. E, paralelamente, indo da submissão da mulher como ‘rainha do lar’, até a revolta feminista com a queima de sutiãs e tudo mais, a revolução sexual com hippies por todos os lados, e a troca de papéis, com toda a insegurança dos homens com a própria masculinidade, sua reafirmação o tempo inteiro e a fixação com seu próprio, por que não dizer, pinto. Entre outras, é claro.

Várias personalidades brasileiras fizeram parte desta evolução toda. Mas te digo que na hora em que Gretchen e Sidney Magal deram as caras, achei que nunca mais iríamos nos recuperar. Peroxita, Merilú e eu mesma, todas nós passaríamos mal, muito mal, por lá mesmo e não teríamos forças para nos levantar e sair. Muitíssimo engraçado, nunca vi.

Uma peça leve e divertida, com perfeita mistura entre os recursos musicais tão nítidos, os efeitos de palco e a ótima atuação dos oito atores em seus diversos figurinos.

Hoje é a última apresentação, às 21:00, no mesmo teatro. Corram lá pra ver.

Ah sim, as fotos, com o devido crédito, são daqui.

E daí tem também o site deles, com direito até a um trailer no Youtube, vejam lá.

15 de março de 2007

“A vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos para o futuro." (John Lennon)

E quando a gente já desistiu de fazer planos?

Quer dizer que passamos a viver a vida finalmente, ou simplesmente de que estamos mais perdidos do que nunca?

7 de março de 2007

Já entrando nos climas teatrais

Antes de começar o nosso querido e tão esperado Festival de Teatro, e contagiada por esta animação cultural que sempre antecede o evento – muitas vezes até maior do que as peças em si, que acabam não fazendo jus a tamanha ansiedade pessoal – antecipei-me um pouco e fui assistir uma peça que, pelo que me lembro, já tinha feito parte da programação do ano passado, e que eu não sei bem porquê não pude assistir, e que este ano está na programação novamente.

Aperitivos, o nome.

Aperitivos, do autor Mark Harvey Levine, reúne seis peças curtas sobre situações triviais e incomuns do cotidiano. Beirando o absurdo e com uma boa dose de humor, os quadros têm de dez a quinze minutos e apresentam situações como a de duas pessoas deslocadas em uma festa, de um casal que encontra um roteiro do dia ao lado da cama e de um paranormal com problemas amorosos.

Talvez o que tenha me atraído foi o fato da dinâmica toda da coisa, seis quadros, seis histórias, todas de dez a quinze minutos. Ou seja, quase impossível de ser tedioso. Porque nessas coisas teatrais há sempre o 'quase' a ser considerado, conhecimento este que se adquire somente com certa(s) experiência(s) nem sempre muito boas na coisa. Dessa vez acertei em cheio, graças.

Sem contar que em algum lugar da nossa imprensa virtual paranaense, eu li que o próprio diretor já ressaltava que as histórias tinham todas começo, meio e fim, o que muito muito muito me apraz. Nem sei dizer o quanto, mas muito mesmo. Chego a me emocionar com coisas iniciadas e acabadas assim, tão visivelmente. Ainda mais nestas épocas de produções teatrais incontáveis, todas (digo as do Fringe, ao menos) sem passar pelas devidas avaliações prévias, feitas a torto e a direito, muitas vezes com uma pressa do cão, por pessoas que nem sempre honram com o mínimo esperado, mas. Não foi este o caso, definitivamente.

O problema maior é falar sobre sem entregar o ouro totalmente, já que ninguém aqui assistiu ainda e eu recomendo mucho mesmo. Tentemos.


Seis historinhas, todas muito movimentadas, dialogadas e perfeitamente inteligíveis por todos. Devo dizer que, quando iniciada a coisa, eu mesma achei que não gostaria muito. Não sei se pela ferrugem toda nas falas e nos gestos teatrais exagerados ou por causa de uma mulher em particular, que sentava algumas fileiras na nossa frente, que ria descompensadamente ao menor esboço na menor piadinha muito singela e despretensiosa. O que foi deixando tudo deveras sem graça. Ah sim, é comédia.

Mas, nos acostumamos logo com o ambiente e as pessoas e o resto foi só alegria alegria. Quatro atores, se revezando muito bem entre os quadros, com cenários mínimos, mas sempre suficientes.

Tiradas muito boas, umas inteligentes, outras hilárias e outras as duas ao mesmo tempo. As historinhas eram, não necessariamente nesta ordem, O Aluguel, Tons, Superhero, Surpresa, Roteirizado e Aperitivos. Todas desenvolvendo as relações inter-pessoais por esta vida afora, todas tão férteis. Entre marido e mulher, vizinhos, namorados, e assim por diante.


Que realmente, vá ter material mais rico que as relações entre estas pessoas tão diversas e peculiares que nos cercam, né mesmo?

E vejam que o nome não poderia ser melhor para uma peça pré-festival. As coincidências da vida, como diria Merilú.

Percebam que foi tudo muito vago, para não estragar a surpresa, então vão lá sim, que é certo. Leve, bem feito e muito divertido.

5 de março de 2007

In another life, when we are both cats,


A vista dos telhados, de uma de nossas 16 janelas, como diria a Day, sendo as fotos obras dela também.



O tempo normalmente dá ou retira o sentido das coisas e, no caso, ficou meio tarde pra fazer uma “Parte II, Ah, o verão!”, da nossa mesma viagem de carnaval comentada aí embaixo. Ouquei também, já que boa parte das coisas não eram publicáveis mesmo, uma vez que eu própria virei adolescente inconseqüente e delinqüente por aquele dias.

Mãs, vamos lá.

Do que me lembro, choveu né. E ficou nublado a maior parte do tempo, o que não impediu que eu entrasse várias vezes ao dia na água fria do mar, voltasse pra pegar um pouco de mormaço e chuva na areia e retornasse para a água fria do mar. Assim, repetidas vezes, todos os dias, o que culminou, ao final de tudo, numa super dor de garganta e resfriado.

Teve o episódio das cadeiras de praia que ficavam num armário embaixo da escada do prédio e que, por isso, Ferdi Maria e Tate utilizaram sem culpa por dois dias até descobrirem que não eram de utilização comum, mas sim propriedade dos nossos vizinhos, que deviam estar ao nosso lado na areia indignados com o sumiço das cadeiras.

Andamos de banana também, a única das atividades marítimas que o nosso bolso foi capaz de pagar. Havia uns passeios de bóia, que não era uma bóia qualquer, mas um bóia super estilosa; triciclo aquático, esqui, mergulho e mais uns outros tantos passeios super interessantes, e caros, na mesma medida.

Fomos contempladas com duas noites de banda e bloco de foliões instalados na entrada do nosso prédio, que, pelo visto, era de onde ecoava todo o enooorme carnaval de rua da praia. Por mim, tudo bem, já que o barulho não foi o bastante para atrapalhar meu santo sono e, além do quê, tocaram marchinhas, coisa que não ouvia desde os idos de 90, nos carnavais da Sapt, em Torres.

Jogamos, comemos, dormimos, bebemos, dormimos e comemos muitíssimo. Tudo em altas doses. Nosso apê era amplo, bem localizado e bem equipado, o que tornou os dias de chuva dentro de casa um programa até agradável, na companhia do radinho antigo, porém eficiente:



Na volta paramos em Camboriú pra ir ao Camelódromo. Fico impressionada. Existem máquinas digitais de 10.1 megapixels, vcs sabiam? E eu ainda na era do papel...

E conhecemos o café da Méri, que é a coisa mais doce e meiga do mundo inteiro, uma casinha de madeira branca, com dois andares, decorada feito casa de bonecas. Não achei fotos da Méri no nosso amigo google, o que é deveras triste, porque só a imagem da casinha já faria as mocinhas todas exclamarem õõõmmnn... Uma coisa assim muito feminina mesmo.

E foi isso então.

1 de março de 2007

Carnavais

Eis que então, vinte e cinco semanas depois, vamos falar mais um pouco de carnavais.

Governador Celso Ramos, minha gente. Foi pra lá que rumamos nestas festividades tão alegres e contentes, buscando, como sempre, fugir ao máximo das agitações mis que tomam conta de tudo quanto é metro quadrado desta nossa pátria amada por estas épocas.

E até teríamos conseguido com o maior sucesso de todos os tempos, não fosse o fato de a gente não conhecer a praia e nem conhecer ninguém que conhecesse a praia, sendo que "a praia" é formada na verdade por vinte e três praias e, sobretudo, pelo fato de termos que confiar solamente na palavra das pessoas que tentavam alugar suas últimas moradas para turistas como nós, que deixam tudo para absolutamente a última das horas. Eu realmente não sei porque insistem em achar que o que as pessoas procuram em carnaval é o lugar mais movimentado de todos, e encasquetam de achar que este é o melhor para quem pergunta. Mas, só por ainda restarem algumas várias opções em plena quinta-feira antes do carnaval, já era um senhor indício de que as coisas não deviam ser das mais festivas e concorridas.

Digo, o lugar é lindo de morrer, aliás, como sempre acontece neste litoral catarinense, que em cada curva e depois de cada pedra tem uma praia mais linda que a outra.

E também é tranqüilo, no sentido de inexistir carnaval de rua (ufa), bares, boates e afins que funcionassem até mais que uma hora da madrugada, no máximo, e movimentos de carros por todos os lados. Mas ainda assim conseguimos a proeza de nos instalar no super centrinho da praia de Palmas - a escolhida dentre as mil e quinhentas -, em cima de uma lan house e lanchonete, que teve até música ao vivo. Sendo 'música' um único 'músico' e seu teclado multi-sonorizado que passava de Skank pra Brunimarrone pra Rappa e pra, até quem, Mauricio Manieri.

Quase liguei procê Mary, neste momento.

Mas ta, tudo bem mesmo, que a praia compensava.

Só que, nas andanças diurnas na tentativa de conhecer pelo menos umas cinco das vinte e trêêês praias de Celso Ramos, encontramos, aí sim, a praia perfeita para o objetivo fugitivo total: Fazenda da Armação, pessoas. Uma vila de pescadores, com duas ou três pousadinhas (sendo uma delas a coisa mais linda, com estadias de um milhão de dólares), freqüentada pelo mesmo pessoal sempre, sendo a maioria os moradores locais. Ou seja, unicamente para o sossego total.

Até porque o mar, ele, o mar, é uma coisa de louco. Lá fiquei até murchar. Eu, esta criatura tão praiana e nadadora. Então imaginem vocês, pessoas comuns, filhas de Deus.


E tem a Dona Margarida, que mora por lá e tem um bar/lanchonete nas temporadas, cuja lotação maior deve ter sido eu e o digníssimo tomando cerveja ao mesmo tempo.


Diz ela que o areia não é das mais limpas porque tudo o que vem do mar, por lá fica, já que quase ninguém conhece a praia e não tem aquela infra-estrutura louca de manter a coisa atraente para os turistas pagantes. "Porque o mar não quer nada que não seja dele, o que não é dele, ele devolve". E assim os restos de galhos de árvores, folhas, algumas butucas de cigarro e plásticos não identificáveis, ficavam espalhados por alguns lugares da areia branquinha que só. Mas ela que não sabe o que é sujeira, daí acha que falta limpeza. Mas nada, uma coisinha ou outra em lugares quase que imperceptíveis.

E só também, tudo se termina por aqui. Diz que à noite se enxerga a Hercílio Luz lááá do outro lado de lá, e que é tudo muito bonito, mas como o acesso é por estrada de terra, com morros e mais morros, e como só choveu depois desse dia milagroso em que conseguimos aproveitar deveras o feriado encardido, com lamaceira total para qualquer praia e a gente de Ka, tivemos a leve impressão de ser melhor ficar em casinha mesmo à noite. E ficamos. Tomando Nova Skin e engordando.

As outras praias também, todas bonitas, vou te contar. Não entendo isso do litoral de Santa Catarina ser esse espetáculo-maravilha por todos os lados, e o do Paraná, logo ali do ladinho, ser todo cinza de mar e céu. Uma dor de cotovelos sem fim.