28 de maio de 2007

“Quem tem tique não pode jogar”.

Tudo vai bem.

Até que, nesses atendimentos mis em escala industrial, a gente atende uma pessoa com tique.

Sendo que o tique da pessoa era levantar as sobrancelhas e arregalar os olhos assim, meio que umas cinco vezes sucessivas, à medida que ia se concentrando nas perguntas e explicações todas.

Uma beleza.

E, mais ainda, de ficar como que apontando com a cabeça para o seu lado esquerdo, e meu direito. E eu olhei né, porque realmente parecia que ele estava querendo me mostrar alguma coisa praqueles lados. E olhei mais de uma vez, porque a coisa é involuntária, tanto quanto os tiques todos.

Que situaçã, pessoar, que situaçã.

Mas fui forte.

Até porque os atendimentos são sozinhos né, não há ninguém mais na sala, just the two of us, ninguém para dividir a atenção. O que, neste caso foi até bom. Porque né, as reações em massa sobre a mesma situação podem ser desastrosas.

Ainda bem também que o procedimento todo já faz parte de toda uma vida da pessoa, que a gente liga o piloto automático e vai. Sem pensar no amanhã.

E só lembrando das reações em situaçãs análogas em que Merilú estava presente e houve estragos. ‘Jisuis, se Merilú estivesse aqui!’. Como da vez do Elétrica, num dos festivais de teatro da vida, da época do blog roseroxo, ocasião em que eu estava certa que nos iam expulsar do teatro, só estava esperando o momento, e ocasião em que se iniciaram minhas aulas sobre como tapar a boca durante um ataque de riso definitivamente não é a melhor opção, pelo efeito muito mais chamativo da explosão que ocorre quando não se agüenta de jeito nenhum e aquela coisa abafada que se mistura com a risada e tudo mais. E enfim.

Entre outras menos publicáveis.

E da juventude doirada de invernos na praia em que as cousas invariavelmente se descambavam para passar as noites jogando Detetive (não o de tabuleiro, o das cartas, sabem? que tem as vítimas, o assassino e a polícia? tem isso em todo canto será?), e os ‘castigos’ todos de virar alguma coisa alcoólica garganta abaixo, e as conseqüências adolescentes todas desta tão valiosa experiência pela casa das pessoas afora.

Mãs.

Sendo que quem fosse o ‘assassino’ da vez, matava suas vítimas o mais discretamente possível, piscando para elas. Foi aí que se descobriu que uma das pessoas na mesa tinha o tal tique. Esse de piscar. Mais do que o normal, eu digo, e em seqüências mais longas, digamos. Daí que a coisa foi impossível, que essa mesma pessoa ‘matava’ todo mundo sem nem sentir, inclusive o próprio assassino, o que foi deveras confuso, somado às cousas alcoólicas garganta abaixo. E foi aí que a antológica frase aí em riba surgiu, a do título, com o perdão da piadinha interna, é claro, a qual possivelmente nem seja assim tão super engraçada, mas por essas bandas, continua fazendo o maior sucesso.

Os caminhos da mente, né. Eu em Guaratuba nos anos noventa e o atendimento rolando. Numa coisa meio sem olhar direito pra pessoa, o constrangimento todo de um e outro e aquela coisa. Mas é o máximo de controle que se consegue, porque a gente tenta, mas sem abuso.

25 de maio de 2007

Humilhação: tropeçar na escada do trabalho e fazer um barulhão capaz de fazer as pessoas levantarem da cadeira pra vir perguntar se está tudo bem.

Humilhação suprema: seu chefe no alto da escada se agilizando pra te catar do chão.

E hj eu tô sem salto!!!!

23 de maio de 2007

Trabalhe com um barulho desses

Aqui ao lado do escritório tem uma escolinha com berçário.
Faz duas semanas que um bebê chora ininterruptamente o dia todo.
Descobrimos que é uma menininha de três meses que foi acostumada a ficar no colo o tempo todo e que agora passa o dia no berçário.
Como as professoras querem desabituá-la do colo, ela protesta se esgoelando o tempo inteiro, eu disse o tempo INTEIRO.

Concentração amiga, cadê você???

16 de maio de 2007

Tipo assim.

Estou viva, passo bem e tudo mais ou menos sob controle. Sei que as rugas de preocupação da multidão de fiéis leitores desfizeram-se neste momento, mãs.

E atendendo mais pessoas ao mesmo tempo do que eu mesma jamais imaginava que era possível para qualquer pessoa neste mundo afora. Logo eu, que sempre always e forever disse que se coisa houvesse, uma única, que um dia eu pudesse escolher para nunca mais fazer nesta nossa profissão da peste, seria, sem titubear, atender clientes. A ironia, ela sempre.

No entanto e porém, eis que esta experiência praticamente diária na região metropolitana de nossa capitar ecológica serviu ao menos para, de uma vez por todas – e se não fosse agora, não sei mais na vida quando diabos haveria de ser – se desenvolver toda uma paciência voluntária e não forçada em momento algum com as pessoas atendidas, tanto que a coisa deixou de ser um suplício, para ser um sofrimento mais leve um pouco. Um pouco, mas ainda assim. Nessas alturas, já é super.

O problema é o padrão das perguntas, todas iguais, por estarem todos nesta mesma situação jurídica, no caso. Sendo que por ‘todas’, eu quero dizer algumas centenas de. Para serem atendidas, uma a uma. Por moi. E por outro advogado que reveza comigo, mas isso não vem ao caso. Porque eu eu eu eu. E o padrão das dúvidas, as mesmas sempre. E as minhas respostas, as mesmas sempre. Até as piadinhas. Que eu faço piadinhas, pessoa tão descolada que sou. Sabe aqueles professores de cursinho que todo santo ano fazem as mesmas brincadeiras sobre os mesmos assuntos, para alunos que são diferentes? Então. Finalmente entendo o drama.

Mãs, tudo muito construtivo, não fossem os prazos se acumulando na mesa que fica lááá no escritório, esquecido pelas tardes na região metropolitana. Mas isso é outro detalhe não muito agradável que fica pra depois.

Sei que as forças e energias, como disse eu aí num comentário tardio aos posts todos que foram acontecendo so far away from me, vão-se todas consumidas pela ansiedade, o mal maior. Não sei se do século, mas meu eu garanto. O diacho do frio na barriga e do organismo todo em alerta alimentam-se das energias da pessoa. Bem podiam alimentar-se da gordura toda da pessoa, mas nãããão. Estas estão aí, firmes e fortes. Aliás, nada firmes, mas sempre fortes e crescentes.

Tudo assim muito muito vago, a la noche, só pra dizer que sim, I’ll survive e um belo dia eu voltarei! Fé, muita fé.

E o cliente, então, que te dá carona até a esquina do escritório e se despede dizendo: "não vá se perder hein!"

Ps: Percebam que estou respeitando a ordem cronológica dos acontecimentos. E ainda faltam 2 horas e meia até o fim do expediente...

E o que pretende o velho que se aproxima do amigo pra cochichar alguma coisa em pleno elevador, quando no elevador estão somente eles e eu?

+_+

Güente.

14 de maio de 2007

POR UM ACASO

Poderia ter acontecido.
Teve que acontecer.
Aconteceu antes. Depois. Mais perto. Mais longe.
Aconteceu, mas não com você.
Você foi salvo pois foi o primeiro.
Você foi salvo pois foi o último.
Porque estava sozinho. Com outros. Na direita. Na esquerda.
Porque chovia. Por causa da sombra.
Por causa do sol.
Você teve sorte, havia uma floresta.
Você teve sorte, não havia árvores.
Você teve sorte, um trilho, um gancho, uma trave, um freio,
um batente, uma curva, um milímetro, um instante.
Você teve sorte, o camelo passou pelo olho da agulha.
Em conseqüência, porque, no entanto, porém.
O que teria acontecido se uma mão, um pé,
a um passo, por um fio de uma coincidência.
Então você está aí? A salvo, por enquanto, das tormentas em curso?
Um só buraco na rede e você escapou?
Fiquei mudo de surpresa.
Escuta, como seu coração dispara em mim.

WISLAWA SZYMBORSKA

9 de maio de 2007

Meu tempo é quando – parte II

Esse post tem mais ou menos um ano de atraso, porque na época, não achei que havia algo do que falar que não fosse causar forte indignação. Para a minha pessoa no caso. E para a psicologia enquanto estudo do comportamento.

Ocorre que à algumas coisas falta tanto critério e à algumas pessoas falta tanta percepção, que só nos resta rir da ironia da cousa toda.

“Inventário de Atitude do Trabalho” ou, como apelidado pelo Rafa, “Inventário mother fucker psicográfico”.

Consiste numas 48645 perguntas sobre comportamento profissional, a fim de traçar o perfil profissional da pessoa. Sim, porque hoje não se fala mais em 'talentos para determinadas áreas do conhecimento', mas sim em 'perfis para determinadas funções'. Aliás, não se fala mais em "talentos", estes foram substituídos pelas palavrinhas nada simpáticas “habilidades vendáveis”.

Pois sim. Para todas as perguntas deve ser marcada uma resposta, obrigatoriamente, ainda que nenhuma das respostas corresponda àquela que seria dada por vc. Não bastasse, as perguntas se repetem inúmeras vezes pelo teste afora, com respostas diferentes e, por vezes, opostas àquelas outras da pergunta anterior. Mais ou menos assim: numa pergunta vc assinala, contrariada, a alternativa “a”, porque na verdade ela não teria resposta pra vc, mas vc tem que responder. Mais à frente, surge a mesma pergunta, com outras respostas, opostas àquela da anterior, sendo que deve ser assinalada a que mais tem a ver com vc; em não havendo, qualquer uma, que, por isso, vai ser absolutamente oposta a alternativa “a” antes assinalada, que já tinha muito pouco a ver com vc. E assim vai.

Aí que chegou o dia da “orientação individual”, que seria a análise do resultado deste teste cujo resultado alimenta um programa que forma um gráfico. Este é o gráfico dos seus pontos fortes e fracos. São analisadas várias características divididas em grupos de “administrativas”, "interpessoais’ e “intrapessoais”.

Daí que o meu gráfico é de uma pessoa problemática, por assim dizer.

Segundo a psicóloga que aplicou o teste e depois me entregou o resultado, devidamente comentado, nas palavras da própria: existe uma "porra-lôca" dentro de mim querendo se liberar e sendo impedida pela minha ‘dificuldade em tomar decisões’, esta, por sua vez, decorrente do ‘medo da perda’.

E mais um bocado de outras coisas na mesma linha, só que mais pra baixo.

Para finalizar, sofro de um conflito existencial entre o meu ímpeto pelo arrojo e o meu conservadorismo. Trocando em miúdos, preciso de ajuda profissional. Sabe cumé, pra resolver esse "dilema interno" que está me impedindo de escolher entre um e outro.

No entanto, analisando superficialmente o meu gráfico eu mesma pude perceber que as colunas vistas assim, de maneira global, e, considerando os grupos de características, denunciavam uma série de contrariedades. Qualquer um poderia por ex. olhar o gráfico e, sem titubear, encontrar ali um conflito entre a minha vontade de ousar ou de abraçar o certo ao invés do duvidoso. Qualquer um, menos, talvez, a psicóloga.

Certo que há este conflito. Sempre houve e sempre haverá, e, até onde entendo, graças ao Senhor Jesus, que não quero mesmo optar por uma das coisas e com esta permanecer para todo o sempre. No entanto, isto não significa em absoluto todas as outras conclusões que o gráfico dela tirou por si só, consciente e sensível que não foi à pessoa que se sentou à frente dela e que disse coisas que deveriam ter sido avaliadas, quando menos, em conjunto.

Numa dessas que as pessoas menos esclarecidas entram em desajuste com as demais e caem no dilema aquele do ‘ó, como sou incompreendido’, como se houvesse compreensão no mundo e isso não fosse um falso problema, seguido de uma falsa crise.

Contudo, hoje relendo o texto e lembrando do quanto fiquei atônita e considerando o tempo que passou e as novas idéias que surgiram, devo dizer que o conflito persiste e todo o resto deve ser jogado fora, exatamente como há um ano atrás, com a diferença de que agora convivo melhor com a contradição, a minha e a dos outros.

Na minha ânsia por coerência e congruência, perdi todas as vezes em que tentei compreender o que não se compreende e justificar o que não se justifica, e ainda assim teimei nesta tarefa ingrata. Ainda teimo, na verdade, mas dou a isso menos importância, o que suavizou deveras uma porção de coisas.

E, claro, prossigo naquela do arrojo x conservadorismo, passeando pelos dois lados e tentando sair o menos chamuscada possível.

4 de maio de 2007

"Ah, meu deus, e eu ainda ensinei ela a rebater...."

Juju pegou o buquê. Ou parte dele, mas ainda assim veio certeira a florzinha vermelha diretamente para as mãos de Juju. Thi, um tanto preocupado depois de ouvir a massa gritando o seu nome, solta-me esta pérola de ainda a ter ensinado a rebater...

Nesse momento, já alterada das idéias, não pude evitar enxergar Juju tomando impulso entre as demais e rebatendo a flor que vinha em sua direção. Fato incrível este que, apesar de peculiar, seria bastante possível, já que Juju em tempos remotos, foi campeã de peteca no colégio, juntamente com Kerol, sua dupla. E a peteca que sempre me pareceu um esporte pouco útil (perdoem-me meninas) vem surpreender desta maneira mais de década depois.

Esbaldei-me de champanha e saí da festa, aliás, saímos todos, somente depois de ver os “hômi” pendurados nos lustres pra retirar as flores da decoração. Percebi que era o fim também depois do laquê me boicotar e meus cabelos começarem a desabar, dando uma aparência um tanto decadente ao visual. Afora os fios puxados do vestido graças ao contato com a minha pulseira nova que, contrariamente ao estrago, tinha o objetivo de ser a peça mais brilhante da produção.

Graças que houve este feriado de terça pra pessoa ao menos tentar se recuperar do baque, que os anos de má postura começam a pesar a esta altura da vida e minha coluna num güenta mais 10 horas seguidas de salto 15 fino.

Tem sempre aquele momento né, introspectivo, que ocorre mesmo depois de todo o álcool, em que a pessoa pára concentrada pra olhar em volta e gravar a cena e constatar com emoção que todos se encontram na mesma situação, exultantes de aligriiia. Prova disso foram as declarações de amizade e amoR que todos sentimos um pelo outro all together now que nem sempre levaram em conta as pessoas desconhecidas que eram abraçadas em conjunto.

Eu e Day, transgressoras que somos, atravessamos a área restrita ao casório e subimos as escadas do Castelo pra dar uma olhadinha nos cômodos de cima. Uma coisa realmente.

Ninguém caiu na pista, que me lembre. Vi Marcinho querido apenas se desequilibrar um minuto e quase cair pra trás, mas foi tão linda a recuperação, com a pessoa emendando um passinho em seguida e saltitando no ritmo da música até estar de pé de novo, que não se pode considerar isso uma gafe, de reito nium.

Foi o primeiro casamento da turma. Ao menos o primeiro comemorado tradicionalmente com igreja e festa. Sei não se os nouvos aproveitaram na mesma medida, mas os convidados posso garantir que sim, diante do desbunde de cores e brilhos e dos reencontros e da confraternização geral de turmas, o que tornou tudo véri véri funny.

* up date: mas veja só que orguuuulho que só agora me apercebo desta maravilha de dois dos citados no texto poderem ser linkados para os seus respectivos blogues!! Ó a evolução dos tempos!

3 de maio de 2007

Cortázar, Julio

Entre a Maga e mim cresce um canavial de palavras, estamos separados só por algumas horas e alguns quarteirões e já a minha pena se chama pena, meu amor se chama amor...Irei sentindo cada vez menos e recordando cada vez mais, mas o que é a recordação, afinal, senão o idioma dos sentimentos, um dicionário de rostos e dias e perfumes que voltam como os verbos e os adjetivos no discurso, adiantando-se disfarçados, à coisa em si, ao presente puro, entristecendo-nos ou lecionando-nos vicariamente até que o próprio ser se torna vicário, o rosto que olha para trás abre muito os olhos, o verdadeiro rosto se mancha pouco a pouco como nas velhas fotografias e Jano, de repente, é igual a qualquer um de nós. Vou dizendo isso tudo a Crevel, mas é com a Maga que estou falando, agora que estamos tão longe um do outro. E não lhe falo com as palavras que só serviriam para que não nos entendêssemos, agora que já é tarde começo a escolher outras, as dela, as envoltas naquilo que ela compreende e não tem nome, auras e tensões que crispam o ar entre dois corpos ou enchem de ouro em pó um quarto ou um verso. Mas não vivemos assim o tempo todo, lacerando-nos docemente? Não, não vivemos assim, ela quis, porém uma vez mais voltei a instalar a falsa ordem que estimula o caos, a fingir que me entregava a uma vida profunda da qual só tocava a terrível água com a ponta do pé. Existem rios metafísicos, ela nada por eles como aquela andorinha está nadando pelo ar, girando alucinada, em torno do campanário, deixando-se cair para melhor levantar com o impulso. Eu descrevo e defino e desejo esse rios; ela nada por eles. Eu os procuro, os encontro, olho-os da ponte, e ela nada por eles. E, sem o saber, igualzinha à andorinha. Não precisa saber, como eu; pode viver na desordem sem que nenhuma consciência de ordem a retenha. Essa desordem é a sua ordem misteriosa, essa boêmia do corpo e da alma que lhe abre de par em par as verdadeiras portas. A sua vida não é desordem, a não ser para mim, enterrado em preconceitos que eu desprezo e respeito ao mesmo tempo. Eu, condenado a ser absolvido irremediavelmente pela Maga, que me julga sem saber. Ah, deixa-me entrar, deixa-me ver algum dia da mesma forma como vêem os teus olhos.