23 de fevereiro de 2007

Enquanto isso,

Nalgum lugar não menos nublado do litoral catarinense, estávamos nós procurando atividades diurnas e noturnas a fim de retirar até o bagaço desse feriado de cinco dias, conseguido a duras penas.

Comecemos pela viagem de ônibus. Ah, as viagens de ônibus.

Já fiz uma bem longa uma vez em que dois sujeitos sentados, claro, no banco detrás do meu, aproveitavam todas as paradas pra tomar cerveja e entravam às 3 da madrugada no ônibus de latinha em punho, exalando odores nada agradáveis pra quem dorme, apesar. E fumavam no banheiro, naturalmente, como ícones máximos da transgressão no transporte coletivo.

Em viagem de carnaval não haveria de ser diferente, ora pois. Daííí que dois sujeitinhos muito novos que já bebiam na rodoviária enquanto punham as malas no bagageiro, sentaram onde? Naturalmente, na poltrona imediatamente atrás de mim e de Ferdi Maria.

Andavam quietos os meninos até metade da viagem, quando então os efeitos da cachaça chegaram no seu ápice de expressão. Não tardou, um deles, balançando a garrafa pra lá e pra cá, espirrar vodka nos cabelos de Ferdi Maria, o que foi, diga-se, o mesmo que aventurar-se em terreno inóspito e selvagem.

Um dos rapazes, o único que falava, já que o outro se limitava a emitir alguns sons ininteligíveis, desatou a pedir “desculpas, minha queridaa”, “ele não teve a intençauuum”, “em momento alguuum ele quis ofendeer você”, blábláblá..., ao que Ferdi Maria respondia apenas: “então tá, agora acabou, se comporta amigo, tá todo mundo viajando sossegado, faça o mesmo”.


Tamanha indiferença de Ferdi Maria às desculpas do rapaz o deixaram magoado, no entanto, razão pela qual tentou ainda: “desculpa queridaaa, foi sem querer, também não precisa me tratar como um capacho”. E num momento máximo de ofensa, ele atirou os próprios óculos em Ferdi Maria. Nunca havia pensado nos óculos de sol como arma de defesa, mãs, os bêbados tem este talento de sempre pensar algo inusitado antes de todo mundo.

Infeliz idéia. Aí iniciou-se a via crucis; o motorista parou o ônibus, chamou a atenção dos meninos, confiscou a garrafa de vodka já vazia, disse em voz grossa que se eles não se comportassem 'ia parar nos hômi', os meninos afundaram na poltrona e prometeram se comportar. No que saiu o motorista, quiseram ainda barganhar desculpas com Ferdi Maria oferecendo cd´s para ela ouvir, se irritaram com uns argentinos (evidentemente argentinos) sentados na nossa frente e mandaram eles voltarem para o sudeste, que aqui era o lugar deles e não de 'paulista metido'. Ameaçaram ainda jogar os óculos num outro rapaz que parecia prestar atenção na conversa deles, que isso não era certo, afinal 'tá na constituição' que eles não podem ser tratados assim. Travaram uma conversação em pretenso inglês, algo do tipo “i want crazy”, “i want crazy merrrmo!” e pareceram preocupados quando um deles foi até a cabine do motorista e descobriu que o ônibus estava indo para Bombinhas e não para Florianópolis. Depois disso, esse mesmo voltou algumas vezes à cabine do motorista, não sem esquecer a mochila com mais quatro ou cinco garrafas de vodka que iam batendo uma na outra no percurso, enquanto a bermuda e a cueca do rapaz escorregavam até o pé.

O motorista, por sua vez, provavelmente cansado das visitas do bêbado resolveu parar num ponto qualquer no meio do caminho pra um deles descer. Alvoroço geral entre os outros passageiros quando viram que o bêbado falante permanecia na poltrona. Todos avisaram em coro à ele então que o amigo estava descendo e que ele fosse também, afinal, ‘pra não ficar sozinho’. Desceram, levaram uns quinze minutos retirando as malas, chamaram a atenção das pessoas nas casas da rua e ainda correram atrás do ônibus, assim que este arrancou.

No dia seguinte, quando já acomodadas na nossa casinha e recebendo a visita de Marcinho querido, que estava em outra casa em outra praia, Marcinho, com expressão um tanto cansada, aproveita para desabafar, e nos conta que não estava agüentando mais uns meninos malas que estavam na mesma casa que ele, porque, ...só pra ver o nível da coisa, acredita que cada um deles entornou uma garrafa de vodka na viagem?

As coincidências da vida.

22 de fevereiro de 2007

Curitiba tem sua primeira passeata de mortos-vivos no domingo de Carnaval: é o Zombie Walk

A gente deixa a cidade por uns diazinhos solamente e o melhor da festa acontece onde, ooonde?

Impressionante.

Há notícias de que já foi feito antes, em São Paulo e em Porto Alegre, mas quase posso assegurar que em nenhum outro lugar do mundo teria caído tão bem e arrebatado participantes mais entusiasmados do que aqui na terrinha:


Etiqueta zumbi
Para evitar distorções da estética zumbi (fato que ocorreu em outras zombie walks realizadas no Brasil), é importante citar que os participantes da caminhada em Curitiba devem estar caracterizados como mortos-vivos, tais quais os vistos em filmes de George Romero...


Só para esclarecer, em linhas gerais, os interessados em participar: zumbis não correm, apenas andam se arrastando, de forma cambaleante. Se vestem com roupas esfarrapadas (afinal eles são defuntos em fase de decomposição que voltaram à vida e saíram de seus caixões) e devem ter uma maquiagem que os deixem pálidos. Por fim, zumbis não falam, muito menos adotam posturas político-ideológicas ou religiosas. No máximo resmungam a palavra "miolos..." como no primeiro filme do gênero.

Seria só mais um dos eventos da série bizarrice & non sense, tão comuns em Curitiba, a passar despercebido, não fosse um dos zumbis, ou zombies, pra ser mais exata, ser um amigo nosso, o conhecido capanhêro Rafa:

Mariana diz:
meu deus, eu vi pela tv, no intervalo do “gala gay” com monique evans, que é forte candidato a ser meu programa clássico de carnaval
Mariana diz:
e o zumbi walk conseguiu ser pior kerol
Mariana diz:
jisuis
Carolina diz:
hahahahahaha
Carolina diz:
meeeeu senhor
Carolina diz:
mostrando o carnaval de vários lugares
Carolina diz:
todos felizes, saltitantes, contentes e saudáveis
Carolina diz:
e me chega em curitiba, um bando de gente fantasiado de morto e vagando pelo Largo
Carolina diz:
meu senhor
Carolina diz:
e o rafael foi nisso????
Mariana diz:
meu senhor mêischmo
Carolina diz:
mas ele foi fantasiado mary?
Mariana diz:
foi kerol
Mariana diz:
veja com seus próprios olhos






Carolina diz:
meeeeeeeeeeeeeeeeeeeu senhor amado
Mariana diz:
hahahahahahahahaha
Mariana diz:
ai sério
Mariana diz:
num guento isso
Carolina diz:
meeeeeeeeeeeeu deus mary
Carolina diz:
meu deus
Carolina diz:
ele ta fantasiado mary
Carolina diz:
ele ta fantasiaaaaado
Carolina diz:
ele ta com a cara pintada de branco e fazendo cara de morto, mary
Carolina diz:
ou uma tentativa de
Carolina diz:
meu senhor amado
Carolina diz:
não
Carolina diz:
olhe
Mariana diz:
socooooooorro
Carolina diz:
mary

Carolina diz:
não, e o rafael tava ainda com uma camiseta do star wars, ou é impressão?
Carolina diz:
ta loco
Mariana diz:
e diz que eles não resmungavam 'miooolos', kerol, mas 'brain', 'braiin...'
Mariana diz:
que eles são zombies
Mariana diz:
não qualquer zumbizinho tupiniquim
Carolina diz:
hahahahahaha
Carolina diz:
hahahahahahahaha
Carolina diz:
ai mary
Carolina diz:
ta brincando
Carolina diz:
hahahahahaha
Mariana diz:
hahahahahahahaha
Carolina diz:
nao sei nem traduzir este sentimento que toma conta de meu ser neste momento
Carolina diz:
hahahahahahaha
Carolina diz:
ó vida
Carolina diz:
hahahahahaha
Mariana diz:
hahahahahaha
Carolina diz:
me faltam as palavras mesmo
Mariana diz:
hahahahahaha
Carolina diz:
nao acredito que eles ficavam falando 'brain... brain...'


(...)

Brincadeiras à parte, parabéns à idéia da Zombie Walk que, afinal de contas, nos rendeu mais risadas que o feriado nublado na praia, cheio de pessoas coradas e saltitantes.

Mais fotos podem ser vistas aqui, com direito às espiritosas como a noiva zumbi e a zumbi do cartaz escrito "Rauuuuhr (grunhido)" até as realmente medonhas.

16 de fevereiro de 2007

Era isso!

Uma das secretárias intrometeu-se, Vai ver é um segredo delicioso, disse, e me olhou com malícia: Ou não? Uma rajada ardente abrasou meu rosto. Maldição, pensei, como o rubor é desleal. Outra, radiante, me apontou com o dedo. Que maravilha! Ainda tem a elegância de ficar vermelho. Sua impertinência me provocou outro rubor em cima do rubor. Deve ter sido uma noite feroz, disse a primeira secretária: Que inveja! E me deu um beijo que ficou pintado na minha cara. Os fotógrafos deliraram (Gabriel García Márques, Memórias de minhas putas tristes, 7ª edição, p. 50).

Era isso que eu queria dizer sobre o quão traiçoeiro é o tal rubor, mas, por absoluta falta de capacidade e/ou percepção, Garcia Marques disse antes de mim. Sempre atrasada, te contar.

Sei que é justamente isso que me incomoda tanto ao falar para públicos: o fato de ficar visivelmente vermelha. Primeiro que cá tenho a pele por demais alva, para não dizer brancura total, o que ajuda deveras a denunciar ao mundo o menor sinal de meu desconforto. E depois que principalmente ao fazer ‘brincadeiras’ para ‘descontrair’ é que a coisa fica mais feia. O triste é que às vezes eu nem estou sentindo realmente vergonha de nada, e lá fico vermelha de graça. Sendo que, por sua vez, isso sim é que me faz sentir a real vergonha e vem o tal ‘rubor em cima do rubor’, que é duplamente irritante.

E olhe que, sendo adEvogada, eu estou acostumada a falar, falar e falar e várias pessoas me ouvirem atentamente ou pelo menos fingindo muito bem que, o que não me incomoda em absoluto. Mas me coloque na frente de uma platéia de ouvintes e pronto, está feito o estrago. Que cousa, não?

Digo isso porque num grupo de estudos filosóficos, espirituais e afins, de que eu gosto muito de participar, diga-se, não é raro eu começar a falar e logo, não mais que de repente, cá me reparar desconcertantemente roxa. Aquele calor nas bochechas, sabe? Isso sem necessariamente sentir qualquer tipo de constrangimento, o que dificulta a solução. Saco saco. Mais cousas a serem trabalhadas.

Nunca mais tinha me incomodado com isso, mas esse descompasso já está dando nos nelvos.

Seria condicionamento aos assuntos do Direito? Seria uma total atrapalhação de meu ser, ou um descontrole das emoções mis, ou ainda um retardo à adolescência e seus fiascos sem fim?

Olhe que nem o amigo Sig explica.

14 de fevereiro de 2007

Não resisti.

Dica preciosííssima de Dayana Kelly, também conhecida como K. Morena, apresento-lhes Princesa Sissi divagando sobre o Dia dos Namorados comemorado na data de hoje, lá no lado de cima do Equador:

"... Gosto deste dia porquê? Porque, na realidade, ele não significa um caralho, tal como todos os outros dias de alguma coisa, ao contrário do que se quer pensar. Porque um dia de uma merda qualquer significa automaticamente a exclusão dessa merda nos outros dias todos e no meu calendário mando eu. Adelante. Depois é um dia bonito também porque recebemos peluches, flores, molduras a dizer I Love You (que Amo-te soa mal…), aventuramo-nos num restaurante um pouco mais carote que os que servem as tradicionais Entremeadas e Morcelas de Arroz e conseguimos não vir para casa a cheirar a fritos, depilamo-nos e esperamos pela foda «especial», cuja «especialidade» reside em ser a meio da semana, mandamos mais sms´s que nos outros dias e, na loucura, ainda nos vão ao cú.

Ora, eu não quero com isto dizer que todas estas coisas são más. Recordo apenas que o ano tem 365 dias e noites e que todas são boas para isto e muito mais. Enerva-me um pouco esta falta de imaginação em dedicar um dia aos namorados quando os próprios se esforçam de caralho em manter o namoro o ano todo. Digamos que é um dia que com o passar do tempo e evolução das relações se tornou como o penteado da Farrah Fawcett: obsoleto.

Maneiras que é isto."

É lusitana, caso não tenham percebido.

Melhor ainda.

13 de fevereiro de 2007

Sobre perder o seu lugar preferido na vida.

Eu tinha um, sabe. Que veio a ser descoberto há alguns anos, não lembro bem como, mas que se tornou preferido em pouco tempo porque era tudo o que havia de peculiar e que me agradava em cheio.

Aí criei todo um ciúmes por tudo o que se referia ao lugar e só levava lá as pessoas que julgava se agradassem e valorizassem as mesmas coisas e pudessem dar àquilo o mesmo significado. Enfim, tudo o que se costuma chamar de especial.

Isso de apresentar lugares especiais pra outras pessoas é uma coisa muito séria pra mim. Porque eu sequer falo de lugares dos quais eu gosto pra pessoas que me são indiferentes ou que eu não gostaria de encontrar no lugar que tenho por especial. Auxiliada pelo fato de serem lugares normalmente desconhecidos, dentro das minhas possibilidades, faço a minha parte mantendo-os secretos ou selecionando os freqüentadores.

Por outro lado, a todos aqueles de quem eu gosto é imediata a vontade de compartilhar daquilo que me é mais caro. Como uma prova de confiança mesmo, e de estreitamento dos laços. Aqueles rituais todos de entrada na vida do outro que, diga-se, nem sempre são compreendidos e respeitados da forma como deveriam.

Até aqui, nenhuma novidade, afinal, não é assim com tudo o que se preza na vida?

Só que os lugares tem lá a sua trajetória própria que como tudo, ou quase tudo, foge à nossa vontade. E o lugar cai na boca de todos, chama a atenção de mais pessoas, que passam a frequentá-lo não exatamente por se agradarem dele, mas porque aquele lugar é comentado. E o público muda, e o seu lugar cativo já não está sempre disponível pra vc. Um pouco mais de tempo e de movimento e o lugar inevitavelmente fica pequeno para si e passa pela temível e infalível necessidade de expansão. Aquela coisa do "isso ia acontecer, mais cedo ou mais tarde". Assim como aconteceu com o disco de vinil, o vídeo cassete e a máquina fotográfica. Embora os substitutos modernos não sejam exatamente melhores, eles iam acontecer,...o que me coloca em estado máximo de nostalgia já vivido até hoje. Falei né, que jamais fui tão nostálgica como agora? Daí que neste estado, nem sendo melhores os substitutos iriam me agradar, já que o simples fato de fazer parte de um passado torna os primeiros especialmente únicos e insuperáveis.


O que dizer do seu lugar preferido então? Que não se torna apenas difícil e mais caro, como aconteceu com os vinis, mas simplesmente deixa de existir. Pra ocupar somente a memória, com suas boas e más lembranças, mais vivas do que nunca.

12 de fevereiro de 2007

Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver. C. Lispector

Eu. 29 anos (recém completados, viu Mary?). Temor infundado da proximidade dos 30. Escrevo pouco. Falo muito (desordenadamente, sobre vários assuntos ao mesmo tempo). Língua solta. Agitada na maior parte do tempo (só engato a marcha lenta na hora das refeições). Impaciente (mantra que preciso repetir: “não atropele as pessoas”). Pessimista. Prática e, digamos, organizada. Libriana, mas não indecisa. Característica do signo que sou obrigada a admitir: futilidade. Consumista voraz. Ironia: arma predileta. Cinismo: não me orgulho disso. Não gosto de mudanças. Amo música e adoro dançar. Fazendo jus às origens caiçaras (de pai e mãe), adoro praia. Detesto frio, apesar de achar que Curitiba tem mais charme no inverno.

Que mais?

Ah, sou muito concisa....

7 de fevereiro de 2007

"Um único momento de beleza e amor justifica a vida inteira" (Rubem Alves).

Pois então. Moi.

Eu sou a Carolina, prazer.

Apresentações não são lá o meu forte, pelo menos não em público. Aliás, entregando o ouro desde já, tenho uma vergonha terrível de falar em público. No sentido de platéia, digo. E ficar constrangida é umas das coisas mais desconcertantes, ainda mais quando se fica vermelha, o que é sempre. E quando o fato de sentir-se ficando vermelha causa ainda mais vergonha e daí fica vermelho em cima de vermelho. Aquela coisa sem fim. Gabriel Garcia Marques escreveu alguma coisa sobre isso, vou procurar.

Mas, como eu dizia, essa coisa de apresentar-se em público talvez não me apeteça tanto mais pelo fato de, na maioria das vezes, interessar mais aos outros o que você faça do que propriamente quem você seja. Sem contar que neste preciso momento a coisa é em público, mas por escrito, o que muito me conforta. Não só por não correr o risco daquela vermelhidão toda como também pelo fato de escrever, em si.

Vejamos. Eu.

Ainda acredito, e muito, nessa nossa humanidade, por mais que os seus componentes tentem me provar o contrário o tempo inteiro. Não adianta, que a crença e o santo são fortes. Otimista de carteirinha, devo dizer, e mesmo os – breves e não tão breves assim – intervalos de apocalipse now, acabam invariavelmente com aquela boa e velha esperança de dias melhores, que me retoma o fôlego e impulsiona para frente. Para onde, diga-se, é que se anda.

Acredito que são os momentos que valem à pena. Os instantes. Que não devem ser subestimados. É deles que a vida é feita. Um único deles, como diz a frase, pode ser suficiente para justificar uma vida inteira. E é preciso atenção, esforço e prática constante para continuar os notando, para não se deixar atropelar e perder o foco.

Falo muito e escrevo demais. Tenho esta leve tendência a ser prolixa, com pouquíssima capacidade para a síntese. Então agüentem.

Acho amizades sempre surpreendentes. As verdadeiras, sempre no bom sentido. Na realidade é a sintonia entre as pessoas que me surpreende, uma satisfação só. Não só da pessoa já saber o que a outra vai falar, por exemplo, mas de em se falando pouco, quase nada ou nada mesmo, a outra simplesmente saber. Isso tanto em amizades como também em amores, é o mais bonito de tudo.

Morro de medo de barata. Bichos cascudos em geral, e que voem.

Não sei nadar e só entro mui raramente só em mares calmos. E parados. E ainda assim não posso deixar de sentir o chão bem debaixo dos meus pés por mais de alguns segundos antes do pânico total. Aliás, o chão fica sempre colado nos meus pés em tudo. Em todos os sentidos, ou quase.

Mas sei andar de bicicleta e dirigir. Uso carro pra quase tudo. Não que seja algo que me orgulhe, mas.

Bem que tento, mas não gosto de exercícios. Saco. E adoro pizza, massas e molhos, o que agrava sensivelmente as coisas. Camarão, carne seca, alcaparras. Pimenta e muito sal.

Sou advogada, e gosto de boas partes da profissão, mas não sei se serei pro resto da minha vida. Pelo menos assim não imagino. Não que me veja fazendo alguma outra coisa específica, mas ainda assim. Acho sinceramente que seria mais feliz fazendo outra coisa, mas não tenho as coragens suficientes, o que é uma lástima. Muito do peso carregado é por conta de saber que é uma lástima. Mãs, sempre há tempo.

Já fui professorinha de inglês. Fiz dois períodos de espanhol.

Gosto de música. Muito. Mas nunca aprendi a tocar nada. Acho que até tenho um bom ouvido, especialmente para em que não entende nada, ou talvez só por isso. Gostaria de saber tocar piano, cheguei a me ensaiar para ter aulas, mas deixei para trás.

Costumava me apavorar se as coisas saíssem de controle, ou se eu perdesse as rédeas das situações, mas agora já nem tanto. O que é bom, muito bom. As coisas se acertam, é incrível. E equilíbrio é tudo nessas horas.

Não sei cozinhar, mas estou aprendendo, a passos de tartaruga. E, para total surpresa minha, até que gostando dessas coisas de cuidar de casa. Só não me peça para passar nada.

Com exceção do espanhol, tudo o que eu comecei, eu terminei, e sempre no mesmo lugar onde começado. Por exemplos, na minha primeira escolinha, entrei com a idade mínima e saí com a idade máxima. Primeiro grau, a mesma coisa, só saí por não existir segundo grau lá. Segundo grau até terceirão também no mesmo colégio. Vestibular, faculdade, inteira na mesma e no tempo certo. Um único estágio justamente no mesmo escritório que eu estou até hoje, há quase oito anos.

Também morei vinte e oito anos exatamente na mesma casa.

Ah sim, tenho vinte e oito anos. Em setembro, vinte e nove.

Ano passado foi a minha primeira mudança, pra duas quadras de distância. Mas mudanças de hábitos e de estado de espírito não se medem em quadras, isso é certo.

Talvez por isso mudanças em geral sejam assim tão delicadas e exijam tantas energias. Não chegam a ser um problema terrível, mas comodista que sou – e não estou dizendo que isso seja bom, vejam – gasto tempos e ansiedades só pensando em como poderá vir a ser depois da mudança, e se der certo e se der errado, do que com o ato de mudar propriamente. E isso já me fez desistir de várias coisas que nem comecei e que possivelmente seriam melhores. Mas, coisas a se trabalhar.

Tenho o riso frouxo que só, e presto muito pouca atenção a detalhes e não sou tão organizada quanto gostaria. E vejam que eu sou virginiana, sendo todas as previsões, sinto informar, furadas. Em compensação, crítica ferrenha de mim mesma, mas melhorando muito nisso, sorte minha.

Tirando tantas outras coisas que cá não me lembro – porque eu esqueço de tudo mesmo – e somando tantas outras que, quem sabe, eu ainda nem notei, sou eu. Essa, e mais ninguém.

2 de fevereiro de 2007

"Você já se sentiu como se todos estivessem no palco e você fosse a única pessoa sentada na platéia?"

Eu gosto da vida simples, mas ela não me preenche por muito tempo. Eu preciso de algumas coisinhas fúteis sem as quais não há bem-estar, de jeito algum. Coisinhas como manicure e pedicure, meia dúzia de produtos de beleza, cama limpa e macia.

Tenho 28 anos e a proximidade dos 30 e, mais um pouco, do fim da vida reprodutiva me põe bastante ansiosa às vezes. Não com muita freqüência já que a vida familiar e a maternidade não são absolutamente desejos intrínsecos meus. Talvez porque tenha isso em demasia até hoje; a vida familiar, bem entendido. Refiro-me à leve pressão que todos, mais cedo ou mais tarde, passam a sentir depois de bombardeados incessantemente e por anos a fio pela publicidade e pelas exigências de consumo.

Como ser várias em uma só? As escolhas me são tão limitativas. Essas escolhas de rumo que definem o que vc vai fazer para o resto da vida, com quem vai estar, onde vai viver, que são o aglomerado de escolhas que acabam por definir se vc será feliz ou se não. Parece-me um tanto óbvio de que é impossível manter-se feliz por muito tempo, ou mesmo, de que isso seja até pouco proveitoso, já que o estado de felicidade é por si só um estado de estagnação. E também acho que a felicidade não é para todos, porque requer uma dose de alienação inviável aos "muito" lúcidos. Mas, para estes, talvez sobre um destino bem mais interessante, porque livre, autêntico e verdadeiro.

Gosto de algumas regrinhas, as de convivência, de harmonia e de ordem. Talvez por isso tenha feito Direito. Não sei. Acho que, na verdade, a razão da escolha foi bem menos nobre. Acho que fiz Direito porque achava que o status me faria sentir-me importante e destacada. Aquela coisa do trabalho difícil, que pouca gente seria capaz de fazer ou, ao menos, de fazer bem feito. Eu sempre gostei disso do diferenciador, da qualidade que te torna destacado entre os outros, que te torna especial. Especial pela diferença. E procuro por isso em tudo na vida. Aliás, esta é a minha procura. O homem destacável e diferenciado pela qualidade de valores e pensamentos que poucos ou que ninguém mais tem. O trabalho destacável e diferenciado pela exigência pessoal e intelectual. Os gostos e preferências que apontam para o que há de pouco comum, para o que tem cheiro de inédito.

Ah, e o fundamental: eu tenho o péssimo hábito de entregar o ouro ao bandido. Sempre, todas as vezes. E ainda não sei se já aprendi a lição.