3 de abril de 2007

"Não existe bem ou mal: só conhecimento e ignorância".

Mais uma das onze peças assistidas esse ano, que pelo jeito até dezembro vamos escrever sobre, foi A sobrancelha é o bigode do olho – Uma conferência do Barão de Itararé.



Convidado a explanar sobre otimismo, o Barão de Itararé acaba por destilar seu humor crítico acerca dos temas mais improváveis do cotidiano. Mas sem falsa modéstia, acaba por apresentar aos afortunados ouvintes, o “ovo-de-colombo” para um convívio harmonioso com a incoerência humana.

Antes de mais tudo, é bom se saber quem foi a figura(ça) do Barão de Itararé. Para isso, recorramos mais uma vez ao nosso amado Releituras, poupando o trabalho de vocês de ler um texto enorme aqui no blog. Mas não me enganem, leiam lá que vai cair na prova. Pincelando as mais relevantes, entre tantas façanhas, um resumo amigo:

Apparicio Fernando de Brinkerhoff Torelly era o seu nome verdadeiro. Viveu de 1895 a 1971. Em 1918, durante as suas férias, sofreu um derrame, abandonando a faculdade de medicina e iniciando, a partir daí, uma série de viagens pelo interior, fazendo conferências sobre diversos assuntos. Publicou vários sonetos e artigos em jornais e revistas, trabalhou em outros jornais, dentre os quais O Globo, fundando o seu próprio em 1926, "A Manha".
Em 1930, com a revolução, proclamou-se Duque de Itararé, herói da batalha que não houve. Semanas depois, rebaixou-se a Barão como prova de modéstia.
Foi preso, ao que tudo indica, duas vezes por seus ideais revolucionários publicados muitas vezes em seu jornal.
E se conta uma pequena história a seu respeito:

Corria o ano de 1928. Em Porto Alegre, uma conferência sobre pesquisa para descobrir a causa da aftosa (doença que ataca o gado) mobilizava um público atento. Getúlio Vargas, então deputado no Distrito Federal (Rio de Janeiro), estava presente. O conferencista, dono de argumentação técnica consistente, impressionava. No encerramento, disse:
— É imperioso que desenvolvamos esse tipo de pesquisa, para benefício do Brasil, pois que uma vacina eficaz contra a aftosa tem grande significado econômico.
Criado o clima de gran finale, aumentou a voltagem atmosférica, ao desafiar, subitamente:
— Afinal de contas, quem é que somos nós? Repito: quem é que somos nós?
Ato contínuo, frente a uma platéia literalmente hipnotizada, o conferencista começou a dançar e a cantar o conhecido hino: "Nós somos da pátria amada, fiéis soldados...". E dançando e cantando saiu da sala.


Daí que tudo isso faz parte da peça em questã. Um monólogo de pouco mais de uma hora, em que o Barão de Itararé é incorporado com muita propriedade pelo ator Márcio Vito, passando a divagar sobre os mais variados assuntos, demonstrar algumas de suas teorias mais mirabolantes e, acima de tudo, filosofar sobre os assuntos da vida com todo o otimismo possível ao seu público, a platéia.

Completamente à vontade no corpo do Barão, o experiente ator diverte e entretém com uma espontaneidade que só à custa de muito trabalho de pesquisa de época, costumes e da própria figura retratada, é que se adquire da maneira tão clara como foi mostrada. Muito, muito bom.

E vocês vejam né, o que não é a versatilidade da pessoa. Estávamos nós lá com o Barão de Itararé tão bem incorporado – nem falo interpretado pra não diminuir a força toda da atuação do moço – e, quando a peça acabou, me volta o ator de lá de dentro, despido completamente de seu personagem, pelo simples fato de ter tirado os óculos. Toda uma expressão que mudou, sem ele tirar praticamente nada das roupas de senhor de época, e ainda assim se via perfeitamente a diferença. Coisa de louco, a satisfação que dá neste momento.

Tão diferente a outras que vimos pela vida afora, em que nem se via o personagem, era o ator e só o ator, o mesmo que fazia a peça e aparecia depois para agradecer e dar os recados. Coisa mais sem graça, trabalho nenhum. Assim, até eu.

Ouquei, menos, menos.

Lindo o trabalho da equipe toda de não sei quantas pessoas, a interpretação do querido Marcio, e o ritmo da peça, que não caiu em um momento sequer. Porque monólogo é um perigo que só, mesmo para quem já está relativamente acostumado com o negócio.

As fotos, como quase sempre, são daqui.

5 comentários:

MARIANA disse...

É, e na peça teve a parte do "quem somos nós? quem somos nós?" "Nós somos as cantoras do rááádio", hahahaha. Figuraça mesmo o tal do auto-intitulado Barão de Itararé, a ponto de render uma ficção das melhores, apesar de tudo ter ocorrido realmente, na vida real e palpável da pessoa.

Às vezes penso que toda essa autenticidade e excentricidade positiva, inteligente, nem cabe mais no mundo de hoje, massificado e pasteurizado como é. Uma pena. O máximo de excentricidade que conhecemos vem de tipos como a socialite Narcisa, por ex., que é nitidamente drogadita, mãs... Nem sei porque lembrei dela.

Parábens ao Márcio Vito que é um ator de se tirar o chapéu. Ficamos realmente impactadas quando ele voltou para agradecer o público, despido da pele do Barão - embora ainda com o figurino todo - parecendo uma outra pessoa. A pessoa Márcio, no caso. Tem talentos que deixam a gente sinceramente comovida mesmo.

Anônimo disse...

"Aviso aos Navegantes:
Não há bóia no Brasil!"
Barão de Itararé

moças, estou aqui pertinho,
em floripa, com os olhos mareados.
texto lindo e carinhoso, obrigado.

por acaso (saudado e bom acaso!)
dei com esta bóia no mar da rede.
bóia firme, necessária e boa.
amanhã o barão entre em cena
no festival isnard azevedo e espero
poder trazer a ilha um pouco
de tudo que me encanta no Apporelly
o teatro daqui é o maior em que
já me apresentei com a peça.

forte abraço e até uma volta,
ou como diria o Barão, uma revolta
pois ele sempre "volta a voltar".

CAROLINA disse...

Pois vocês vejam né, que agora que me apercebi de não haver datas nos comentários. Como pode isso.

Então, amigo Márcio, cá não sei se desejo boa sorte na apresentação de Floripa ou se pergunto como foi. Provavelmente esta última opçã.

Mas menino, nós que agradecemos a consideração toda sua, imagina. O Barão ele próprio é uma figura rara, mas com toda a certeza precisava de alguém a altura para demonstrar isso pelo mundo afora. E foi o que aconteceu, né mesmo?

Apareeeça. E longa vida à peça.

Rene Augusto disse...

Otimismo!

Anônimo disse...

Moças,
o Barão foi muito bem em Floripa.
O Festival terminou ontem,
3 prêmios ficaram conosco.
Ator, Direção e Espetáculo
na votação do público! Demais!
Forte abraço!